Crítica: The Idol (Episódios 1 e 2) – Festival de Cannes 2023

The Idol – Ficha técnica:
Criação: Reza Fahim, Sam Levinson, The Weeknd
Nacionalidade e Lançamento: Estados Unidos, 2023 (Festival de Cannes)
Sinopse: Após ter sua última turnê mundial impedida por um colapso mental, Jocelyn está determinada a reivindicar seu antigo status como a maior e mais sensual artista pop dos Estados Unidos. Quem reacende suas paixões é Tedros, empresário de casas noturnas com um passado sórdido. Será que seu despertar romântico vai levá-la aos gloriosos louros da fama, ou às profundezas mais obscuras de sua alma?
Elenco: Lily-Rose Depp, The Weeknd, Suzanna Son, Troye Sivan, Moses Sumney.

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Desafiando todas as críticas negativas e escândalos de bastidores envolvendo inclusive a demissão de uma diretora, decidi assistir à estreia de The Idol, nova aposta da HBO, em Cannes. Mesmo que todos os sinais apontassem para o meu possível arrependimento, fui com a mente mais aberta que podia assistir à segunda exibição mundial dos dois primeiros episódios da série, na sala Agnès Varda. Primeiro porque eu acredito que toda pessoa deve ter sua experiência pessoal antes de tirar conclusões, e também porque devo admitir que tanta repercussão negativa me deixou no mínimo curiosa. Seria possível que a HBO, depois de tanta aclamação da crítica, se arriscaria a um projeto tão aparentemente desastroso? Eu queria saber.

A revelação foi a pior possível: não apenas eu me decepcionei profundamente com a série, como a grande maioria das críticas apontavam, como me vi diante de um dos maiores desperdícios de casting e orçamento na televisão recente. Dirigida por Sam Levinson em parceria com Abel (The Weekend), The Idol é um trabalho que envolve diretamente a visão criativa de Sam (criador de Euphoria) com a vivência dos bastidores da indústria da música, na perspectiva de Abel. Para esse projeto, ambos alinharam suas experiências e habilidades e construíram a partir da amizade que cultivam e da relação criada com cada ator e atriz no set, o que gostariam que a obra fosse e qual seria a linha criativa a ser adotada – que ao fim decidiram chamar de abertamente provocativa.

Levinson já tem experiência com séries provocativas, diga-se de passagem. Euphoria é um ótimo e aclamado exemplo de uma série cuja provocação é constante e sobre temas relacionados à adolescentes e jovens adultos considerados polêmicos por muitos, como sexo e consumo de drogas. Por isso, quero deixar claro que não acho que exista problema algum em uma história que puxe os limites dos mais variados temas, por mais polêmicos que sejam. A questão é que, diferentemente de Euphoria, The Idol não parece querer provocar para construir, e o resultado são cenas chocantes que, narrativamente falando, carecem de sentido e de função.

Não estou aqui para questionar a beleza estética e gen z das imagens de Levinson, já que estas claramente agradam o público-alvo de suas séries – e são realmente muito bem filmadas. Porém, estou aqui para questionar até quando esse vai ser o maior mérito do diretor, que parece que agora se contenta apenas em filmar variações de uma mesma cena, dando a entender que o que mais importa mesmo é apenas o viral. Levinson diz que tirou inspiração de reality shows para a dinâmica de algumas cenas, cujos diálogos parecem ocorrer ao mesmo tempo, para dar uma agilidade maior e um senso de urgência. Contudo, o que acaba parecendo para quem assiste de fora é que as cenas foram simplesmente mal editadas.

Pedaços de uma conversa emendados na outra, cortes e mais cortes desnecessários e tudo que deveria ser transmitido para nós a partir dessa ideia que ele conta como sendo genial, em tela não passa de algo, então suponho, muito mal executado. No que tange à construção dos personagens, parece que não houve tempo para conversar sobre isso nas cinco semanas que antecederam a gravação do primeiro episódio. Acredito que outros assuntos acabaram sendo mais importantes que esse e a construção dos personagens foi acontecendo à medida que cada episódio era filmado – ao menos é o que eu quero acreditar quando vejo o personagem Tedros interpretado de forma nada convincente pelo Abel.

Lily-Rose Depp ainda tentou bastante, mas junto com Rachel Sennott – que também está muito bem em todos os episódios -, não conseguem salvar essa série de momentos profundamente toscos (como é a cena do quarto e da venda, no segundo episódio) ou dos acontecimentos desconexos, que parecem ser apenas jogados a cada momento e de qualquer forma na história. No geral, o que me parece é que The Idol sabe que se tornou uma grande bagunça depois de um tempo e tentar ajeitar isso na pós-produção foi a única forma que sobrou de salvar o material que já se tinha.

Minha aposta, por último, é que essa nova produção da HBO só sobrevive até o fim da primeira temporada. O segundo episódio parece ser uma concretização dos sonhos masculinos de Abel, bem mais que uma manifestação de poder sobre o próprio corpo vindo da personagem Jocelyn (que por sinal aparece muito mais sem roupas que com, a todo momento, mesmo quando acorda). Conhecendo suas músicas e a forma como Abel trata sua vida pessoal em seu trabalho, The Idol me pareceu ser, até onde assisti, mais uma forma de abordar na arte aquilo que se passa na sua vida. Só acho que dessa vez ele poderia manter isso em um diário – custaria bem menos.